ALFABETIZAÇÃO ECOLÓGICA — O DESAFIO PARA A EDUCAÇÃO NO SÉCULO XXI

Enviado por Saulo Wanderley, jornalista e músico formado pela Unicamp, membro fundador do Núcleo Música Nova de São Paulo.

(http://trombeta.cafemusic.com.br/trombeta.cfm?CodigoMateria=93)

 

Uma das grandes presenças no III Fórum Social mundial é Frijof Capra, conhecido no Brasil pelos seus best sellers "O Tao da Física" (1975) e "O Ponto de Mutação" (1982). Ao longo do último quarto de século, o físico austríaco observa a integração entre o homem e o planeta, da comparação entre Oriente e Ocidente ao inevitável desenvolvimento sustentável e ecológico pelo qual milita hoje.

A alfabetização ecológica é hoje uma das frentes em que Capra atua. Segundo o físico, teve suas raízes na biologia organística, na Gestalterapia e na cibernética, coisas da primeira metade do século XX. Esses movimentos já se caracterizavam por ser uma alternativa não excessivamente mística aos procedimentos da ciência tradicional, e desaguaram na Teoria da Complexidade nas últimas décadas e o trabalho de Lester Brown do World Watch Institute em 1980.

Essa teoria pressupõe a interação e interdependência de sistemas entre si e suas partes. Sistemas dentro de sistemas. Sua grande diferenciação é entre Meta e Forma. No mundo atual prevalece a Meta, pela mensurabilidade e quantificação, enfim, coisas que podem ser medidas. Já a Forma envolve relacionamentos, organizações, coisas que podem ser mapeadas.

Capra considera de extrema importância a contribuição da arte, dos artistas para o desenvolvimento da ciência. Pelo lado da biologia cita Goethe, e de uma forma mais ampla, Leonardo da Vinci, que segundo ele, tem sua vida baseada no estudo dos padrões de relacionamento. Mais recentemente, a teoria dos fractais — que aproveita fórmulas matemáticas da natureza — veio a dar visualidade a esses padrões.

Nos projetos desenvolvidos com crianças na Califórnia, Capra se utiliza da arte em três formas básicas: no auxílio ao desenvolvimento de padrões, na formação de um ambiente que favorece o aprendizado e principalmente na ampliação da dimensão emocional que também beneficia a educação. Atividades como tocar um instrumento ou cantar aumentam comprovadamente a capacidade do pensamento espacial. Ler aumenta a criatividade.

Ele acredita em uma crescente importância da alfabetização ecológica neste século. Nessa direção, o física aponta a necessidade de uma reforma escolar, que trate de desenvolver novos processos de se aprender, e um novo processo de lideranças, envolvendo crianças, professores, pais e funcionários da nova escola, pois o novo ensino será uma troca cíclica, e não uma relação hierárquica.

As crianças não são potes vazios à espera de serem enchidos. Como teoria a sustentar as aplicações práticas na nova escola, Capra elegeu o que chama de princípios de sustentabilidade ou fatos básicos da vida, com que as crianças tomam contato nos seus projetos piloto. Um postulado básico é "o que sobra de certas espécies alimenta outras".

A aplicação prática compreende uma ponte, uma ligação entre o planejamento humano e os sistemas naturais, cujo postulado, por sua vez é "não extrair da natureza e sim conviver com ela". A essa ponte ele chama de design ecológico, com uma experimentação de aprendizados baseados no mundo real, em hortas domésticas, plantio, desenvolvimento, colheita e culinária, por exemplo.

Capra lembra que no final dos anos 50 os psicólogos infantis descobriram a importância das sensações com efeitos benéficos no aprendizado. As sensações vividas nas experiências com as hortas são, segundo ele, inesquecíveis. O embasamento científico demonstra que a rede neural humana responde ao meio ambiente de modo mais forte na infância.

A mente cresce e se desenvolve em função do desenvolvimento as funções cognitivas e não do desenvolvimento de células. A ausência de sensações positivas face a adaptabilidade do cérebro humano pode comprometer o rendimento neural. O que aprendemos é como que organizado pelas emoções, e estas, via cognição, leva ao aprendizado social.

Estudos demonstram que a percepção dos padrões de relacionamentos se perde quando existe o stress. Nesses casos, a percepção se resume apenas aos objetos. Capra insiste nas condições ótimas para o aprendizado: segurança emocional, ambiente sensorial rico e apoio da comunidade. Citou como importante contribuição nesses pontos a obra de Paulo Freire.