As
tribos ‘escondidas’
Estudos desenvolvidos no IB podem
contribuir
para a revisão da legislação ambiental
Seis
espécies das tribos Barnadesia
e Mutisieae, da família do Girassol (Asteraceae), estavam escondidas em algum lugar da
diversidade do Estado de São Paulo. A língua-de-vaca (Chaptalia graminifolia),
o espinho-de-agulha-cipó (Dasyphyllum synacanthum),
o cambarazinho-do-campo (Gochnatia orbiculata), o
cambará-cinzento (Gochnatia sórdida), o cravo-do-campo
(Lulia nervosa), a margaridinha (Holocheilus illustris e H. brasiliensis) e o fumo-bravo (Trixis verbascifolia)
foram encontradas recentemente durante levantamento taxonômico das
tribos no qual o biólogo Marcelo Monge Egea, do
Instituto de Biologia da Unicamp, contou e estudou 55 espécies. Antes da
dissertação, presumia-se a ocorrência de apenas 30. As novas informações devem
contribuir para estudos futuros e também para a revisão da legislação
ambiental, que, em sua opinião, está sem informações precisas para que se saiba
o que está se extinguindo.
De acordo
com Monge, além desses novos registros, muitas informações importantes foram
acumuladas sobre a aplicação das plantas, pois algumas delas são usadas na
medicina tradicional e na produção de medicamentos. Ele acrescenta que, apesar
de estarem descritas na literatura, não havia registro das plantas na flora
paulista. “Não encontrei nenhuma espécie nova porque para ser considerada
inédita, ela teria de nunca ter sido descrita na literatura. Mas não havia
registro delas em levantamentos anteriores realizados no Estado”, esclarece.
O
levantamento revela que 40% das tribos estudadas ocorrem no estado de São
Paulo, já que no Brasil são encontradas 138 espécies desses grupos. A
distribuição de algumas plantas, segundo o biólogo, concentrava-se mais na
região centro-oeste e na região sul do país, de acordo com levantamentos feitos
anteriormente. “A diversidade desses grupos em São Paulo é muito grande. Esse é
o primeiro dado”, acrescenta.
Segundo
Monge, informações que constavam de um levantamento inicial da Flora de São
Paulo feito em 1998 se perderam por conta de problemas técnicos. Agora,
essas novas informações são importantes para que efetivamente sejam traçadas
medidas conservacionistas mais efetivas e mais
precisas, segundo o autor. Ele explica que, com a pesquisa, vieram à tona
informações sobre a biologia das plantas investigadas necessárias tanto para a
tomada de decisões em unidades de conservação ou para se ter conhecimento dos elementos
que podem provocar a extinção de plantas. Algumas dessas informações referem-se
a ciclo de vida, época da floração e frutificação, ambientes onde as plantas
ocorrem. As plantas são responsáveis pela alimentação de diversos grupos,
entre eles estão os polinizadores, como abelhas,
borboletas, beija-flores, entre outros pássaros e herbávoros,
como lagartas e pulgões. As plantas são relevantes para manter o bom
funcionamento do ecossistema, segundo o pesquisador.
Outra
informação é de que as plantas estão em áreas restritas e não espalhadas pelo Estado todo e, diante desse dado, ele receia
que qualquer intervenção inadequada possa levar à degradação de ambientes específicos
como os montanos, que abrigam parte das espécies. A
intervenção equivocada, segundo ele, pode levá-las à extinção.
Estes dados
mais precisos sobre a flora paulista indicam onde as espécies ocorrem e como
são, se elas são raras, se ocorrem em apenas um local no Estado. Segundo
Marcelo, os dados também podem contribuir no desenvolvimento de políticas conservacionistas. “Algumas ocorrem em apenas uma
localidade”, acrescenta Monge. Para o pesquisador, as decisões não podem ser
tomadas somente no campo político, mas devem ser embasadas na área técnica e
acadêmica.
Monge
explica que o projeto desenvolvido para a dissertação se insere no contexto
maior que é o levantamento de flora de São Paulo. Segundo ele, o projeto
envolve diversas instituições e pesquisadores paulistas e de outros estados, o
que deu origem à produção de seis livros. “A proposta é publicar esse
conhecimento produzido em forma de livro”, explica. Cada volume tem o
tratamento taxonômico para diferentes famílias de plantas.
Para chegar
a esses dados, Monge realizou várias coletas em diferentes lugares do estado,
tentando amostrar todas as regiões, desde florestas até cerrados.
Publicação
Tese: “As tribos Barnadesieae
e Mutisieae s.l. (Asteraceae)
no Estado de São Paulo, Brasil”
Autor: Marcelo Monge Egea
Orientação: João Semir
Unidade: Instituto de Biologia (IB)
Espécies
podem estar em extinção
Visita a
herbários do Instituto Botânico, da Universidade de São Paulo (USP) e também do
Instituto Agronômico de Campinas (IAC) aproximou Monge das coleções existentes
em São Paulo, mas também mostrou que oito espécies estão presumivelmente em
extinção. “Fui visitar as coleções, que já haviam sido amostradas no Estado de
São Paulo. Além dessas, visitei outras coleções importantes para o sudeste e
também para a flora brasileira”, explica. Segundo Monge, muitas plantas que
ocorrem em São Paulo se repetem em outros estados, por exemplo, em Minas
Gerais.
Assim o
levantamento florístico trouxe dados de novos
registros e também trouxe informações de espécies presumivelmente extintas.
Antes de visitar os herbários, ele também visitou um acervo virtual. Os
materiais consultados continham informações sobre as plantas e os ambientes
onde elas se encontravam. Por exemplo, nos bairros paulistanos do Jabaquara e
da Vila Ema existia uma vegetação campestre natural que hoje não ocorre mais.
Ele observou que uma espécie, Gochnatia rotundifolia, tinha somente registro para São
Paulo e Rio de Janeiro, mas ao visitar os herbários, o material do Rio de Janeiro
não foi localizado. As últimas coletas desta espécie datam da década de 1950.
“Isso significa que esta espécie não é coletada há 60 anos”, explica. Foram
buscados critérios no livro sobre plantas ameaçadas no Estado de São Paulo, que
entre outras coisas indica que plantas que não foram coletadas há mais de 50
anos e não são cultivadas podem estar em extinção. Ao buscar a lista vermelha
de espécies ameaçadas, as plantas estudadas também não constavam na relação.
Essas informações são novas, segundo Egea, pois
ninguém trabalhou com essas plantas no estado de São Paulo. O último trabalho
amplo que tratou de todas Asteraceae,
segundo o autor, foi em 1897. Muitas plantas não tinham registro depois dessa
data.
Entre as
espécies que podem estar extintas no Estado estão Dasyphyllum lanceolatum (Less.) Cabrera, Dasyphyllum aff. vepreculatum (D.Don) Cabrera, Gochnatia floribunda
Cabrera, Gochnatia orbiculata (Malme) Cabrera, Gochnatia rotundifolia Less., Gochnatia velutina (Bong)
Cabrera, Holocheilus brasiliensis
(L.) Cabrera e Lulia nervosa (Less.)
Zardini. A espécie G.
rotundifolia está presumivelmente extinta
na natureza, e não só no Estado. A única espécie endêmica do estado é Chaptalia hermogenis M.D.
Moraes.
A pesquisa
considerou raras as espécies Dasyphyllum candolleanum (Gardner)
Cabrera, Dasyphyllum fodinarum (Gardner) Cabrera, Dasyphyllum lanceolatum (Less.) Cabrera, Dasyphyllum synacanthum
(Baker) Cabrera, Dasyphyllum velutinum
(Baker) Cabrera, Gochnatia sordida (Less.) Cabrera Holocheilus illustris (Vell.) Cabrera, Richterago polymorpha (Less.) Roque, Richterago radiata (Vell.) Roque e Wunderlichia mirabilis Riedel ex Baker.
Apesar do
manancial de informações encontrado em herbários, o pesquisador realizou coleta
de campo em várias cidades, entre elas, Campinas, Presidente Venceslau, Presidente Epitácio, Campos do Jordão, Ubatuba,
São Luís do Paraitinga, e Iporanga.
“Tínhamos escopo fechado de fazer o levantamento em São Paulo, mas decidimos
investigar também o outro lado da fronteira”, acrescenta.
Em sua
opinião, a dissertação também serve para mostrar a necessidade de se realizar
levantamentos florísticos da diversidade vegetal.
Novas pesquisas podem descobrir novos registros não só para São Paulo, mas
também para vários estados. “Também vi material sem essas citações no Pará, no
Paraná e em Minas Gerais”, acrescenta. E olha que foram mais de 10 mil
materiais consultados por ele, o que o levou a montar um banco com mais de 20
mil imagens. Afinal, fez duas fotos para cada item consultado. O banco pessoal
posteriormente será aberto para outros pesquisadores quando o material for
publicado para auxiliar em futuros estudos sobre o tema.
Jornal da UNICAMP, Campinas,
http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/agosto2011/ju503_pag8.php