Guilherme José Purvin
de Figueiredo (Doutor em Direito pela USP. Procurador do Estado de São Paulo.
Coordenador Geral da APRODAB - Associação dos Professores de Direito Ambiental.
Professor de Direito Ambiental - Direito USF; Pós-Graduação
Nota
publicada na coluna da jornalista Mônica Bergamo (FSP
de 17-4-06) dá conta que o Sr. Paulo Skaf, presidente
da FIESP, quer o apoio do governo de SP para um projeto de diminuição do
percentual de 20% de floresta que a lei exige que sejam mantidos em
propriedades rurais, para a preservação do ambiente.
A resistência de determinados setores da produção agrária à implementação
da reserva florestal legal poderia ser eleita como o símbolo das mazelas da
história econômica de nosso país. A despeito de algumas equivocadas (ou
"forçadas") referências à origem desse instituto como instrumento de
proteção dos ecossistemas, a verdade é que a reserva florestal tem,
historicamente, a finalidade de corrigir um erro reiterado do setor ruralista
desde a colonização de nosso país. É importante nos recordarmos que o termo
"reserva" traz à toma a idéia de
"poupança": reserva-se algo que poderá faltar no futuro. Desde em que
o europeu desembarcou em nosso país, o se vê é um processo suicida de
exploração predatória dos recursos naturais. O imediatismo foi responsável pela
decadência do primeiro ciclo da cana-de-açúcar: não se reservava sequer uma
parcela da floresta para um consumo sustentável da lenha que deveria abastecer
as usinas de açúcar. A devastação continuada em busca de lenha tornava a
procura desta cada vez mais árdua e cara, o que contribuiu decisivamente para o
declínio de referido ciclo econômico, já que se tornou cada vez mais
dispendiosa a busca de lenha para o funcionamento das usinas de açúcar.
Não foi diferente nos demais ciclos econômicos por que passou nosso país. E
esta realidade levou nomes que tradicionalmente são associados a outros feitos
políticos a se insurgirem contra a verdadeira estupidez de determinados
produtores rurais, que não conseguiam ver na utilização racional e adequada dos
recursos florestais uma condição "sine qua non" para a continuidade
da própria sobrevivência do setor.
Assim, ainda na década de 1930, época em que sequer se cogitava da proteção das
espécies hoje sabidamente ameaçadas de extinção, tivemos o advento do primeiro
Código Florestal que, antes de mais nada, constituía
uma verdadeira cartilha de educação ambiental em favor dos fazendeiros. Não se destinava, o Código Florestal da década de 30, à proteção do
mico-leão dourado nem da arara-azul. Visava, sim, esclarecer os produtores
rurais que existe um limite para a produtividade rural, e esse limite está
diretamente relacionado com a redução dos índices de umidade, de solaridade, de erosão do solo.
A criação legal da reserva florestal, em síntese, constituiu de certa forma uma
deliberada lição aos fazendeiros, para que não dessem o tiro em seu próprio pé.
A situação não se alterou com o advento do Código Florestal de 1965, que é o
atualmente vigente. Aliás, se alteração houve, esta se deu no sentido da
urgência cada vez mais evidente de se atentar para a inafastável
necessidade de se corrigir um vício secular, que vem sendo denunciado com toda
clareza por José Bonifácio de Andrada e Silva, Euclides da Cunha, Caio Prado
Jr. e Celso Furtado, dentre outros nomes que, com certeza, não são os primeiros
a se pensar quando se pretende invocar os sentimentos do povo em defesa da
proteção do meio ambiente.
O cumprimento da regra prevista no Código Florestal, de reserva de pelo menos
20% das propriedades rurais nos Estados da Região Sul e Sudeste, contra o corte
raso das árvores, admitida a sua exploração econômica,
desde que de acordo com as regras fixadas pelo IBAMA, constitui a última
chamada da natureza em defesa da continuidade da produção agrária em nosso
pais. Para que nossos filhos e netos não sejam obrigados a vagar por desertos
em busca de cactus e calangos.