Nas últimas duas
décadas, especialistas em herpetologia - o estudo de anfíbios e répteis - têm registrado
com freqüência tendências alarmantes envolvendo populações naturais das espécies que
estudam.
Muitas populações locais de rãs, sapos e pererecas,
por exemplo, declinaram acentuadamente de tamanho, enquanto outras simplesmente desapareceram. O problema
é preocupante e tem sido registrado em escala
planetária.
As revistas técnicas especializadas vêm acompanhado a situação e mesmo revistas científicas de interesse mais amplo têm
dado alguma atenção. O semanário científico Science,
por exemplo, já publicou mais
de um artigo sobre esse assunto. Em
julho de 2006, a revista publicou uma carta
assinada por cerca de 50 especialistas do mundo inteiro (quase um abaixo-assinado), chamando a atenção
para o desaparecimento
global de anfíbios [1].
Estariam esses e outros
estudiosos mundo afora exagerando ou seria o desaparecimento
desse animais resultado de um processo mais amplo e duradouro? Ocorre que o fenômeno
às vezes pode ser explicado por fatores locais
mais ou menos
restritos. Esse seria
o caso, por exemplo, da criação
de clareiras no interior da
floresta ou do desflorestamento em pequenas propriedades. Quando o dossel da floresta é removido,
a luz solar passa a incidir diretamente sobre o solo, criando condições excessivamente quentes e secas para a maioria
dos anfíbios. Nessas circunstâncias, muitos deles simplesmente desaparecem do
local.
O desaparecimento local pode ter a ver também
com a presença de animais introduzidos pelos seres humanos [2]. Um exemplo pode
ser visto em áreas de pastagem que abrigam corpos
d'água. Na época chuvosa, o gado bebe em lagoas
que são utilizadas
também pelos anfíbios
O lado mais intrigante
dessa questão, no entanto, envolve o desaparecimento de anfíbios que vivem em
lugares remotos e pouco habitados, sem sinais
evidentes de deterioração ambiental provocada por fatores locais.
Nesses casos, a extensão global do problema sugere que deveríamos
buscar explicações igualmente globais. Dois fatores que
parecem estar contribuindo de modo decisivo para o declínio numérico ou mesmo o desaparecimento
de populações de anfíbios em escala planetária
são a chuva ácida e o aumento na radiação
ultravioleta, provocado pela rarefação na camada de ozônio
atmosférico.
A mesma revista Science, em umas de suas
edições de dezembro (
O que há de inovador
nesse artigo? A principal inovação foi mostrar
que a "separação de hábitats" - que podemos definir aqui
No caso da anurofauna
da floresta atlântica, cerca de 80 por cento das espécies
possuem larvas
aquáticas. Esses e os demais anfíbios
do bioma vivem hoje em pequenos
remanescentes florestais cercados por uma
matriz de hábitats biologicamente empobrecidos e muitas vezes inóspitos
(áreas agrícolas, por exemplo). Nesse
contexto, a reprodução traz riscos adicionais
específicos para esse anfíbios (mas não para
aqueles que se desenvolvem sem passar por um estágio
de larva aquática), pois para isso os
adultos precisam migrar até um segundo
hábitat - a rigor, um processo
duplamente arriscado: na ida, os
adultos precisam sair da floresta
e ir até um corpo d'água próximo;
na volta, adultos e jovens devem retornar ao fragmento original.
Sabendo disso, os pesquisadores decidiram comparar a riqueza de espécies de anfíbios em diversos fragmentos
florestais de acordo com a exigência ou
não de um hábitat separado para as larvas. Ao final do trabalho, os resultados
obtidos por eles mostraram que as diferenças entre os dois
grupos foram bastante significativas, a ponto de poder sustentar a seguinte conclusão: anuros com larvas aquáticas têm desaparecido dos fragmentos de floresta atlântica em um ritmo bem mais
acelerado do que aquele observado para as espécies que não possuem
larvas aquáticas. Isso não significar
dizer, claro, que a situação destes últimos esteja tranqüila, pois não está,
mas sim
que a situação das espécies com larvas aquáticas é particularmente grave e preocupante.