COLÍRIO DEIXA PESSOAS CEGAS

Pelo menos 3 pessoas que perderam a visão após sofrerem cirurgias de catarata no início deste ano poderiam estar enxergando se os órgãos de fiscalização tivessem prestado mais atenção ao alerta de um hospital fluminense sobre a contaminação da solução Metilcelulose HPMC Hypac a 2%. No fim de dezembro de 2002, o Hospital de Olhos Niterói informou à Vigilância Sanitária do Rio que 3 pacientes operados na unidade foram vítimas de endoftalmite (infecção intra-ocular), causada pela bactéria
Enterobacter cloacae. Segundo o comunicado, análises preliminares em lotes do produto, feitas a pedido do hospital pelo Laboratório Silo, mostraram que a solução estava contaminada.

O Hospital de Olhos, no dia 10 Jan. 2003, também avisou à Gerência de Investigação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por email, sobre a contaminação. Mas só foi tomada uma providência em fevereiro [2003], quando a Anvisa publicou uma portaria determinando o recolhimento. O
secretário estadual de Saúde, Gilson Cantarino, disse que abrirá sindicância para saber por que não foi informado sobre o caso.

A Anvisa informou que após receber o comunicado do hospital pediu que fosse feita uma denúncia formal e anexado o laudo médico. Só após ter esses dados, explicou a agência, o medicamento foi interditado em 4 de fevereiro [2003].

A demora em suspender o uso do produto, que tinha feito pelo menos 8 vítimas em 2002, custou a visão de pelo menos mais 3 pessoas, operadas já em 2003. Duas delas foram submetidas a cirurgia em 2 Fev. 2003, na Santa Casa da Misericórdia. Outra vítima foi operada em janeiro na Santa Casa de Sertãozinho, no interior de São Paulo.

Em novembro de 2002, 5 pacientes do Hospital do Fundão já haviam perdido a visão após serem submetidos ao uso do Hypac a 2 por cento. Sem saber o que havia causado o problema, o hospital decidiu suspender as cirurgias de catarata até descobrir o que havia provocado a infecção. A unidade não comunicou o caso à Vigilância Sanitária ou à Anvisa.

Os 3 hospitais que tiveram pacientes afetados poderiam ter evitado o problema, segundo o advogado Alessandro Paula Freitas, que representa 2 pessoas que perderam a visão, se tivessem tomado uma providência simples, ao comprar o produto: "O medicamento não tinha registro no Ministério da Saúde
e basta uma consulta ao site da Anvisa para descobrir isso."

O diretor do Hospital do Fundão, Amâncio Paulino, disse ontem que a unidade não tinha motivos para desconfiar do produto, que foi usado em 4.000 cirurgias: "O produto tinha número de lote, nome do farmacêutico responsável. Se os dados são falsos, é problema da polícia, não meu," disse.

A Mediphacos, em nota oficial, informou que não produz o Hypac – fabricado pela Lenssurgical Oftalmologia -- e que parou de distribuí-lo assim que soube da interdição. A Delegacia de Repressão a Crimes contra a Saúde instaurou ontem inquérito para apurar o caso.


GOIÁS TEM CASO CONFIRMADO DE HANTAVIROSE

Depois de 8 casos confirmados no Triângulo Mineiro no início do mês, a hantavirose chegou em Goiás justamente pelo Sul do Estado, em Campo Alegre, a 70 quilômetros de Catalão. O operador de máquinas O.N.S., de 35 anos, está internado há 11 dias no Hospital de Doenças Tropicais (HDT) em Goiânia com os sintomas da hantavirose e teve o diagnóstico confirmado por um laboratório de Ribeirão Preto (SP). Há outros pacientes na região de Campo Alegre que estão sentindo os mesmos sintomas.

A doença infecciosa, que pode levar à morte, é transmitida principalmente pelo contato com a urina e fezes do rato ou pela aspiração do ar de ambientes com os dejetos do animal. De acordo com o irmão do paciente internado, O.N.S. deve ter sido contaminado quando operava uma máquina da Prefeitura de Campo Alegre na remoção das palhas do resto da colheita de café numa cooperativa da região. "Depois desse trabalho, ele passou a se sentir mal. Ele deve ter respirado o ar da palha quando a colocava nas carretas", conta.

Um dos riscos de contaminação na região Sul de Goiás é justamente o destino dessa palha de café da cooperativa, que foi distribuída para outras propriedades. Técnicos da Secretária Estadual de Saúde (SES) coletaram amostras de sangue dos funcionários da cooperativa para análise em laboratório e vão
capturar roedores silvestre para avaliar se eles são hospedeiros do vírus.

O.N.S. começou a apresentar febre, dor de cabeça e dificuldades para respirar no dia 5 Jun. 2003 e foi atendido na unidade de saúde de Campo Alegre 2 dias depois, no dia 7 Jun. 2003. O operador foi encaminhado para o Hospital de Catalão e depois transferido para o HDT, onde permanece na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

Segundo o diretor do Hospital de Doenças Tropicais (HDT), Boaventura Braz de Queiroz, o estado do paciente ainda é grave mas ele apresenta uma evolução considerada satisfatória. "É um caso de febre hemorrágica por hantavírus, muito típica no sentido de acometer a respiração e apresentar febre alta, fraqueza geral e dores musculares", afirma.

Para o médico, a chegada do vírus em Goiás não foi uma surpresa pois há vários casos de hantavirose confirmados em Estados vizinhos como Mato Grosso e Minas Gerais, onde foram registradas pelo menos 6 mortes. De acordo com Queiroz, não há como atacar o hantavírus e só é possível tratar os sintomas da doença, dando suporte principalmente à respiração do paciente.

De acordo com o diretor do HDT, o sucesso no tratamento depende na experiência em lidar com a doença e na precocidade do diagnóstico. Segundo ele, parte dos casos da doenças podem evoluir satisfatoriamente sem a necessidade de se recorrer às unidades de referência como o HDT. Geralmente, apenas os casos mais graves de hantavirose chegam ao conhecimento dos órgãos de saúde pública, fazendo com que
ocorra subnotificação dos números da doença e que sua gravidade seja superestimada.

Como a quase totalidade dos casos tratados no HDT são originários de outros Estado, o caso de O.N.S. é um dos únicos casos autóctones (surgidos no próprio local) de Goiás. O outro caso hantavirose originário em Goiás ocorreu em Anicuns em abril de 2000, mas a confirmação não foi completa pois não foram encontrados os roedores contaminados.