SOBREVIVÊNCIA RACIONAL...
Rodrigo Beheregaray
Todos os organismos
causam mudanças no ambiente em que vivem, mas somente os seres humanos tem o
poder de destruir todas as outras formas de vida na Terra e o próprio ambiente
do qual depende sua vida. Estão sendo executados planos para alterar as
condições climáticas de vastas regiões, para modificar os cursos dos rios, para
despejar enormes quantidades de restos venenosos nos oceanos. Ao mesmo tempo,
continuam a ocorrer livremente outras ofensas aos ecossistemas:
poluição, erosão, a utilização de biocidas e a destruição de florestas
tropicais, estuários e outros ecossistemas altamente produtivos, sobre os quais
ainda se conhece muito pouco.
No entanto, as pessoas
estão começando a compreender que a natureza não é um adversário a ser vencido.
O homem é apenas um fio na teia da vida. Um ecólogo escreveu: “o objetivo do
homem no jogo com a natureza não é vencer, mas continuar jogando”. A título de
esclarecimento apenas, ecólogos são cientistas especialistas no estudo da
ecologia ou estudiosos da área, e ecologistas são pessoas em geral que defendem
atos preservacionistas sem que sejam necessariamente estudiosos ou entendidos
na ciência da ecologia e, muitas vezes, podem ter um cunho ideológico em seus
pontos de vista.
Os seres humanos não podem negar a sua dependência da Terra. Mesmo
quando os astronautas se aventuram pelo Universo, precisam levar um fragmento
do ecossistema terrestre. Suas vidas dependem da água, do ar e do alimento
trazidos da Terra. Sempre que tentamos analisar alguma coisa isoladamente,
descobrimos que ela está ligada a todo o resto do Universo.
Um exemplo dos efeitos
secundários quando se altera os ecossistemas, é o que ocorreu em Bornéu. Em uma
campanha de controle de mosquitos, foram espalhadas grandes quantidades de DDT
(um veneno organofosforado). O biocida foi eficiente e matou muitos mosquitos.
Entretanto, matou também um grande número de vespas predatórias. As vespas
tinham sido até então o controle da população de um certo tipo de lagarta. O
número de lagartas aumentou, porque não eram prejudicadas pelo DDT, então os
telhados de palha das casas dos nativos começaram a cair porque estavam sendo
devorados pelas lagartas.
Os efeitos colaterais
continuaram a aparecer, pois o DDT foi também usado dentro das casas para matar
moscas. Normalmente, as moscas eram comidas pelos lagartos Geckos, e esses
lagartos começaram a morrer por comerem moscas envenenadas. Então os Geckos
foram comidos pelos gatos domésticos. Os gatos receberam todo o DDT concentrado
nas moscas e nos Geckos. A mortalidade entre os gatos foi tão elevada que os
ratos começaram a invadir as casas à procura de comida. Em Bornéu, os ratos
muitas vezes são portadores de uma terrível doença, a chamada peste negra.
As autoridades ficaram tão alarmadas que providenciaram a descida de
pára-quedas na região de uma remessa de gatos, como primeiro passo para
restaurar o equilíbrio de um ecossistema que haviam perturbado como o uso do
DDT.
Outro exemplo foi no atual Nepal, entre a Índia e a China, na
região habitada pelos Rana Tharus e na região denominada Tarai. Durante quatro
séculos os Tharus viveram praticamente isolados no sopé do Himalaia, protegidos
de outras civilizações pelos mosquitos transmissores da malária. Embora não
sejam imunes, os Tharus desenvolveram certa resistência a essa doença letal. No
entanto, a civilização moderna chegou e trouxe, nos anos 50, o DDT. A malária
foi erradicada, mas com ela também foi a barreira que separava as culturas
vizinhas e mundiais.
Assim, mais pelas
necessidades externas que internas, os Rana Tharus, sem uma adequação gradativa
de adaptação na sociedade moderna, passaram a derrubar excessivamente as
árvores e tem hoje uma grande ameaça de extinção de todo seu ecossistema e de
sua própria existência como povo.
Essa cadeia de eventos
demostra como os seres vivos dependem uns dos outros e como a ignorância do
homem sobre ecologia pode trazer problemas para ele mesmo e para outros seres
vivos. As pessoas estão aprendendo: quando ofendermos a natureza, devemos estar
preparados para uma reação. Para que os seres humanos sobrevivam na Terra,
terão sempre que alterar os ecossistemas de modo a satisfazer suas necessidades
de alimento e abrigo, entre outras. Mas as ofensas ecológicas podem ser
reduzidas a um mínimo: as mudanças devem ser planejadas e executadas com
cuidado. Se assim não for feito, advertem os cientistas, os seres humanos
poderão destruir o ambiente e suas fontes de vida antes do final do século. Não
é de admirar que a ecologia seja chamada de A ciência da sobrevivência.
Há apenas algumas décadas
a ecologia não passava de uma espécie de botânica descritiva. Mas, desde então,
a ciência progrediu muito.
Atualmente os ecólogos
fazem modelos matemáticos de ecossistemas e usam computadores para procurar
predizer os efeitos de alterações em ecossistemas reais. Foram inventados
aparelhos portáteis que automática e acuradamente medem e registram o fluxo de
energia e matéria em um ambiente. Minúsculos transmissores de rádio ou de
satélite podem ser colocados em animais selvagens ou no ambiente para monitorar
uma série de dados. Os sinais são então recebidos por um computador que
registra e já processa as informações que são analisadas de inúmeras formas.
Os ecólogos podem medir a energia que entra anualmente em um grande
ecossistema, como um lago por exemplo. Podem descobrir qual a quantidade de
energia usada para derreter o gelo, para aquecer a água e alimentar os seres
vivos. Hoje já é possível prever quais seriam as conseqüências se várias
mudanças fossem introduzidas em um lago.
Os ecólogos sabem, entretanto, que tem um longo caminho a
percorrer. Sabem que terão que enfrentar imensos problemas. Já foi dito que a
ecologia será a ciência do século vinte e um. Mas desde a algumas décadas os
ecólogos precisam ajudar na solução de uma série de problemas ambientais, como
impedir que a eutroficação acelere o processo de morte dos lagos, encontrando
uma alternativa segura para os biocidas, mantendo a estabilidade dos
ecossistemas e projetando cidades mais adequadas à vida dos seres vivos.Esses
problemas são difíceis e as soluções envolverão todas as ciências. Não
poderemos resolve-los sem o conhecimento profundo do ecossistema terrestre. É
bem mais fácil fabricar um telescópio para olhar as estrelas ou construir um
foguete para descer em Marte do que compreender a Terra e a vida que nos cerca.
E o impacto do homem sobre o ecossistema terrestre tem sido freqüentemente tão
destrutivo que se não dedicarmos um pouco mais de atenção ao estudo da teia da
natureza, não nos restará muito tempo para construir telescópios ou sonhar com
Marte.
Embora a ecologia seja
uma ciência, ela pode e deve influir sobre os princípios básicos do homem. É
necessária uma reavaliação do lugar do homem na natureza e de sua atitude em
relação a ela. Para que o homem sobreviva, é preciso que desenvolva uma
consciência ecológica, com compreensão, amor e respeito pelo ecossistema
terrestre, do qual ele é apenas uma parte.
Para saber mais consulte:
* livro Ecology, science of survival de Laurence Pringle
* e National Geographic Magazine de setembro 2000.