AGENDA 21: UM
PROGRAMA PARA A REFLEXÃO/FORMAÇÃO E A AÇÃO NO
AMBIENTE ESCOLAR
Jaime Tadeu Oliva *
As sociedades modernas definem-se por sua natureza autotransformadora. Suas ações dirigem-se para a construção
do novo, para a remodelação social e física/natural
do mundo. No núcleo dessa remodelação localiza-se o seu motor: o enorme produtivismo. As sociedades modernas são aquelas em que o
crescimento econômico é perseguido incessantemente quase como uma lógica
autônoma, sem subordinação necessária ao bem-estar de suas populações como um
todo. Essa autonomia do crescimento econômico, em geral
associada a interesses minoritários das sociedades, entra em contradição
com um outro aspecto criado e desenvolvido no interior das sociedades modernas.
A saber: a possibilidade da vida política ser exercida por contingentes amplos
da população, com o avanço da organização associativa refletindo os mais
diversos interesses das sociedades. Claro que esse último aspecto não se
desenvolveu tanto quanto a autonomização dos grandes
interesses econômicos. Contudo, avançou o suficiente para que a história do
século XX – período de apogeu das sociedades modernas, em especial no pós
Segunda Guerra Mundial – não possa ser contada sem as contestações que sofreu a
lógica friado crescimento a qualquer custo, aliada
aos interesses econômicos.
Jamais
na história da humanidade a transformação da vida social e
das estruturas físicas do planeta foram tão intensas quanto no século
XIX e, em especial no século XX. E tudo isso alimentado por um enorme e
conflituoso crescimento das atividades econômicas. No interior do sistema
produtivo, marcado por taxas elevadas de exploração do trabalho e por condições
precárias de vida dos segmentos de trabalhadores, surgem importantes revoltas e
derivam daí formas de organização política que colocam na arena de disputa do
poder as classes subalternas. Esse quadro político que contém os novos atores
vai praticamente monopolizar a contestação e a crítica ao sistema produtivista das sociedades capitalistas modernas durante
boa parte do século XX.
Mas, a
partir de meados do século XX, um outro flanco perverso do produtivismo
moderno revela-se e passa a ser alvo de grandes e importantes críticas e
questionamentos. A autonomia do sistema produtivo não só se descolava do
bem-estar da população, como também se mantinha alheia à imensa sobrecarga a
que o meio ambiente terrestre estava sendo submetido com o uso indiscriminado e
irresponsável de seus recursos. A tomada de consciência sobre a possibilidade
dos grandes desequilíbrios naturais, que já estava em andamento, por
parte de vários atores sociais, acabou por dar ensejo a um poderoso movimento,
que colocou no centro da cena do século XX a questão ambiental.
Assim,
se o chamado meio ambiente foi muito solicitado e desgastado no século XX, esse
mesmo período histórico serviu de palco para a articulação e organização de
movimentos e para a elaboração de propostas que visaram bloquear a ação desequilibradora do sistema produtivista
moderno, assim como pressioná-lo para alterar sua natureza, obrigando-o a
repensar as formas de desenvolvimento em direção ao chamado desenvolvimento
sustentável. Essa noção é justamente a exigência para que a produção econômica
nas sociedades modernas deixe de ser autônoma, girando apenas em função de sua
lógica interna, e venha a se subordinar às necessidades do bem-estar geral das
populações e a obrigação de se considerar os limites e o ritmo dos processos
naturais, tendo como meta a reordenação do meio ambiente em bases mais
civilizadas, o que inclui o respeito às várias formas de vida existentes no
planeta.
Desse
modo, o que queremos ressaltar é que se o século XX nos deixou de herança um
ambiente terrestre numa situação de risco e degradação, ao mesmo tempo nos instrumentalizou com uma série de formas de organização e
com um conjunto de propostas que podem reverter esse quadro de risco. E é
justamente nesse contexto que pretendemos destacar e discutir o papel da Agenda
21, um documento aprovado no Rio de Janeiro em 1992, que buscou reunir de modo
completo todo o conjunto de orientações e propostas que vieram surgindo e se
aperfeiçoando nesses últimos 30, 40 anos de luta incessante contra a degradação
ambiental do planeta, para ser implementado nesse século que começamos a viver.
Um
breve histórico de como chegamos até a Agenda 21 exige antes um comentário de
suma importância. Normalmente aponta-se um conjunto de eventos marcantes que
envolveram entidades internacionais e representantes de estado como momentos
históricos decisivos no avanço das lutas contra a degradação ambiental. Nós
também indicaremos a seqüência desses eventos. Entretanto, é necessário
assinalar que nem esses eventos, tampouco as decisões favoráveis à questão
ambiental, teriam sido possíveis caso não existisse um verdadeiro clamor de
significativos segmentos sociais de várias partes do mundo contra o modo como o
sistema produtivo tratava o meio ambiente. Esse clamor, de certo modo mundial,
foi se organizando e com isso pressionando e envolvendo as entidades
governamentais e os organismos mundiais em compromissos, selados nesses
eventos, que buscam solucionar a questão ambiental.
Assim
é que antes de chegarmos na Agenda 21 no Rio de Janeiro, em 1992, três grandes
eventos ocorreram e tiveram expressão mundial. O primeiro deles foi a
Conferência das Nações Unidas, realizada em Estocolmo, na Suécia, em 1972, em
que tiveram assento representantes oficiais de 113 países.
Lá, eles se reuniram e traçaram diretrizes em relação ao meio ambiente. Desse
encontro surgiu a Declaração sobre o Ambiente Humano e o Plano de Ação para o
Meio Ambiente. A partir daí as lutas contra as situações de degradação
ambiental não mais pararam de crescer, assim como os mandatários políticos não
puderam mais deixar de considerar essa dimensão fundamental de nossas vidas.
Pode-se dizer que a questão ambiental começa a invadir a cena política,
inclusive com a organização de novas forças partidárias, que colocavam no centro
de suas plataformas programáticas a questão ambiental. Apesar disso, muito
ainda teria que se caminhar para se chegar a formas mais globais, tanto
institucionais quanto conceituais, de atuação pelo equacionamento dos problemas
ambientais.
Onze
anos após Estocolmo/92, em 1983, a ONU (Organização
das Nações Unidas) cria uma comissão cuja finalidade era produzir estudos mais
aprofundados e detalhados sobre o quadro ambiental do planeta, assim como
arrolar um conjunto de propostas de atuação. A Comissão
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento foi presidida pela líder
do partido trabalhista da Noruega, Gro Harlem Brundtland. Após quatro
anos (1987) essa comissão apresenta o relatório intitulado Nosso
Futuro Comum, que se popularizou com o nome de Relatório Brundtland. Nesse relatório avançou-se a idéia de
desenvolvimento sustentável, em que se assinala, de forma veemente, que em
prosseguindo um modelo produtivista que não considera
a variável ambiental, as próximas gerações não terão ao seu alcance os recursos
necessários para sua sobrevivência. O Relatório Brundtland
é na prática um diagnóstico que se estruturou com base em 8 itens, nos quais se
procura relacionar todos os elementos envolvidos na questão do desenvolvimento
e do meio ambiente, sempre tendo como horizonte uma relação equilibrada entre,
por exemplo, o tamanho do contingente populacional e o meio ambiente, as
questões industrial e energética e o meio ambiente etc. Desse modo, foram se
consolidando discussões em busca de formas de desenvolvimento sustentável. Dito
de outra maneira: o relatório assinala a legitimidade do crescimento econômico
e dos avanços tecnológicos, mas advoga que isso tudo seja repensado em função
dos limites ecológicos do meio ambiente.
Ainda
precedendo o grande evento no Rio de Janeiro em 1992, a ONU convocou a
Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, com o objetivo de ampliar e
enriquecer as discussões em torno do conceito de desenvolvimento sustentável e
todas as implicações que dele derivariam para o mundo. Como já notamos, essa
idéia acaba por abalar um dos elementos estruturantes,
porém perverso, do mundo moderno que é a autonomização
da lógica econômica. Durante dois anos, especialistas de todo o mundo, tendo
como referência o Relatório Brundtland, realizam várias
elaborações e delineiam caminhos para as discussões sobre desenvolvimento
sustentável, que vão de certa maneira preparar as condições para a Rio/92.
Os resultados dessa conferência servirão para a abertura de um processo de
negociação inédito no mundo entre um conjunto significativo de países e
organismos internacionais.
Chega-se
assim, 20 anos após Estocolmo, ao Rio de Janeiro, para a realização do maior
evento histórico sobre a questão ambiental. A Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento contou com a
participação oficial de mais de 140 países, além de eventos paralelos, nos
quais participaram centenas de entidades não-governamentais de vários tipos,
entidades empresariais etc. Como produto oficial, a Conferência Rio/92 lançou ao mundo 5 documentos:
Duas
declarações de princípios
1. A
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em que 27 princípios
sobre direitos e responsabilidades das nações em relação ao desenvolvimento são
arrolados.
2.
Princípios básicos para a gestão, a conservação e o desenvolvimento sustentável
de todos os tipos de florestas, que jogam um papel fundamental no
desenvolvimento.
Duas
convenções acordadas
3.
Convenção de Princípios Básicos das Nações Unidas sobre mudanças climáticas –
visando estabilizar as emissões de gases nocivos à atmosfera.
4.
Convenção sobre Diversidade Biológica, orientando os países signatários a
adotarem medidas que tenham como objetivo preservar os organismos vivos, e
cuidar para que se estabeleça um equilíbrio na distribuição dos benefícios
obtidos na utilização de recursos biológicos.
Um
programa de ação
5. A
Agenda 21, contendo princípios e caminhos na busca do desenvolvimento
sustentado.
A
Agenda 21 é, portanto, no conjunto da produção oficial sobre a questão ambiental
um guia para a ação e aí reside sua importância. Partindo do princípio de que a
natureza dos problemas ambientais ultrapassa as fronteiras nacionais, o
conteúdo da Agenda resultou de um acordo que definiu diretrizes políticas de
ação que vão desde um nível em escala planetária até o nível micro de nossas
vidas: nossas cidades, nossos bairros, os empreendimentos econômicos, nossas
escolas, nossas casas. Um outro elemento presente em todos os tópicos da Agenda
21 é que nunca a questão ambiental é tratada isolada, em si mesma. Seus
aspectos estão sempre correlacionados às questões sociais e econômicas.
Trata-se de um documento compromissado por vários governos e oferecido como
proposta para governos de um modo geral, para todas as organizações sociais internacionais
e nacionais, para entidades empresarias, agências de desenvolvimento e para
sociedade civil como um todo.
A
Agenda 21 é constituída de 40 capítulos divididos em quatro partes. A primeira
relaciona aspectos econômicos e sociais com a questão ambiental. Nela se destacam a questão do desenvolvimento sustentável, do consumo
sustentável e o combate à pobreza. A segunda parte trata o meio ambiente
como provedor de recursos e discute as necessidades e formas de conservação e
gerenciamento desses recursos. São destacáveis as lutas contra: a remoção das
coberturas vegetais, a contaminação das águas, contra a emissão de elementos
tóxicos e perigosos que deterioram os recursos e ameaçam o meio ambiente. Na
terceira parte, mais propriamente política, discute-se o papel dos atores
sociais e o que seria necessário para aumentar sua capacidade de influência nas
lutas ambientais. Merece citação o papel atribuído às mulheres, às populações
indígenas e às organizações não governamentais. Na quarta parte estão presentes
os procedimentos práticos que visam viabilizar e implementar o que está
proposto anteriormente. Refere-se às formas de financiamento do desenvolvimento
sustentável; ao papel da ciência e da tecnologia; aos procedimentos de
cooperação internacional etc. Para nós, é relevante o destaque que é dado ao
papel reservado à educação como uma dimensão da vida em que a consciência sobre
a questão ambiental pode ser desenvolvida e enriquecida.
Quanto
à importância da educação formal, a Agenda 21 reserva o capítulo 36, cujo
título é: Promoção do ensino, da conscientização e do treinamento. Nesse
capítulo, afirma-se que: "O ensino, o aumento da consciência pública e o
treinamento estão vinculados virtualmente a todas as áreas de programa da
Agenda 21 e ainda mais próximas das que se referem à satisfação das
necessidades básicas, fortalecimento institucional e técnica, dados e
informação, ciência e papel dos principais grupos... A Declaração e as
Recomendações da Conferência Intergovernamental de Tbilisi sobre Educação Ambiental, organizada pela UNESCO e
o PNUMA e celebrada em 1977, ofereceram os princípios fundamentais para as
propostas deste documento" (2) . Nessa direção, a
Agenda 21 vai apresentar um conjunto de sugestões para reorientar o ensino no
sentido do desenvolvimento sustentável e para promover formas de familiarização
dos professores com essa questão (3).
São
bem abrangentes e detalhadas as sugestões apresentadas, mas vamos ao essencial.
A Agenda 21 propugna que a temática ambiental seja incluída nos programas de
ensino com a melhor base científica disponível e outras fontes apropriadas de
conhecimento. Assinala que os governos devem procurar atualizar ou preparar
estratégias destinadas a integrar meio ambiente e desenvolvimento como tema
interdisciplinar ao ensino de todos os níveis e que ainda, como obrigação das autoridades, estas devem assegurar que todas
as escolas recebam ajuda para a elaboração de planos de trabalho sobre as
atividades ambientais, com a participação dos estudantes e do pessoal. As escolas
devem estimular a participação dos escolares nos estudos
locais e regionais sobre saúde ambiental, inclusive água potável,
saneamento, alimentação e os ecossistemas e nas atividades pertinentes,
vinculando esse tipo de estudo com os serviços e pesquisas realizadas em
parques nacionais, reservas de fauna e flora, locais de herança ecológica etc.
No
Brasil, o Ministério da Educação vem promovendo ações que colocam em prática as
recomendações da Agenda 21 no que se refere à questão do ensino. Não só, ao
lado do Ministério do Meio Ambiente, participou da produção para o exame e
aprovação do Congresso Nacional de uma lei de Educação Ambiental (4), como por
meio de reforma curricular, concretizada nos Parâmetros Curriculares do Ensino
Básico e Ensino Médio, introduziu a questão ambiental como tema transversal a
todas as disciplinas, ou então como tema de abordagem interdisciplinar. Também
instituiu em sua estrutura orgânica a Coordenação de Educação Ambiental (COEA),
encarregada de executar uma série de ações e programas de introdução definitiva
da temática ambiental no interior do sistema de ensino básico, que é aquele que
possui o maior público. Assim, pode ser afirmado que no campo da educação a
Agenda 21 já vem produzindo seus efeitos positivos (5).
Em termos
práticos e concretos, além de se beneficiar das sugestões propostas pela Agenda
21 para as escolas, o sistema de ensino pode encontrar no próprio documento um
uso direto. O documento em si pode ser tratado como um instrumento de formação
e discussão sobre a questão ambiental. E também como um guia para ação da
comunidade escolar, visando a uma participação em busca de um ambiente
organizado em bases sustentáveis no território em que a escola esteja inserida.
Vamos, sucintamente, tratar desses dois planos.
Em
primeiro lugar, como instrumento de formação e discussão, a Agenda 21
apresenta-se como um documento muito interessante, que serve para alimentar o
tema transversal meio ambiente. Mas para aproveitar todo seu potencial é
necessário que suas elaborações, resoluções e elaborações não sejam tratadas
como verdades absolutas. A Agenda 21, como já dissemos, reúne boa parte das
elaborações sobre a questão ambiental dos últimos anos, não sem assumir algumas
questões bastante difíceis e polêmicas, e será muito saudável discutir seu
conteúdo em ambiente escolar.
Vamos
assinalar alguns pontos polêmicos e que podem orientar discussões e análises
presentes na cultura da militância contra a degradação do meio ambiente e que
de certo modo a Agenda 21 assumiu:
1. Acima
opinamos que o crescimento econômico é algo autônomo em nossas sociedades, em
desrespeito a outras variáveis fundamentais da realidade - os outros interesses
da sociedade como um todo e o meio ambiente, por exemplo. Isso em geral é
identificado a um crescimento econômico desenfreado e também a um crescimento
populacional desenfreado. Essa afirmação é uma das tônicas predominantes do já
citado Relatório Brundtland, que influenciou boa
parte dos documentos posteriores. Mas seria o crescimento demográfico algo que
precisa ser contido para preservação do meio ambiente e a constituição de um
desenvolvimento sustentável? A melhoria de nossas vidas não visaria manter mais
pessoas vivas por mais tempo (e é essa a principal razão do crescimento
demográfico)? Assinalar o crescimento vertiginoso da população como uma das
causas da degradação ambiental não seria um reviver de formulações neomalthusianas, que culpavam os próprios pobres por serem
pobres?
2. A
proposição de desenvolvimento sustentável obriga um repensar dos modelos de
desenvolvimento e isso é saudável e vital para o futuro da humanidade. No
entanto essa discussão não pode ser feita só de modo retórico e alguns
preconceitos precisam ser enfrentados. Necessariamente, políticas de
desenvolvimento sustentável precisarão responder às necessidades gerais das
populações e isso, por si só, significará compatibilizar desenvolvimento
sustentável com produção elevada. É incorreto pensar-se no desenvolvimento
sustentável como algo de escala reduzida, com base em produtos
"naturais" e "orgânicos". Do mesmo modo que o produtivismo atual, uma produção sustentável terá que fazer
uso dos conhecimentos científicos e tecnológicos, só que se exigindo que a
ciência sirva ao desenvolvimento de outra maneira, com outra linha, mais
cuidadosa, menos afoita na busca de lucros. Caso não se encontre uma forma
sustentável de produção elevada (6) esse tipo de desenvolvimento não vingará, a
não ser localizadamente. Talvez essa idéia para
discutir possa ser expressa da seguinte forma sintética: a questão de modelos
de desenvolvimento não se resolve em termos quantitativos e sim em termos
qualitativos. O desenvolvimento sustentável não corresponde à produção menor e
sim à produção melhor e mais equilibrada tanto em termos ambientais quanto
sociais.
3. Com
base em análises técnicas sobre os efeitos maléficos ao meio ambiente em
conseqüência da aglomeração populacional e de atividades em áreas muito
pequenas, ou dito de outro modo, áreas de grande concentração, desenvolveu-se
na cultura ambientalista uma postura anti-cidade
(anti-concentração). A Agenda 21, por sua vez não foge a essa regra ao
referir-se às cidades no capítulo 7 sobre o desenvolvimento sustentável em
assentamentos urbanos. Há sutilmente uma condenação à grande cidade, que teria
desenvolvido um padrão de consumo inviável em relação ao meio ambiente, e um
estímulo para que se desenvolvam preferencialmente cidades médias como forma
mais adequada de assentamento humano. É correto dizer que as grandes cidades
são os nascedouros das principais características do mundo moderno. Para o bem
e para o mal. A contestação ao produtivismo maléfico
do mundo capitalista, por exemplo, surge e se organiza em grandes cidades.
Situações de grande degradação ambiental podem se localizar em pequenas e
médias cidades. Dispersar as populações também pode ser algo que, conforme
ocorrer, pode levar a formas não sustentáveis de vida. Dispersar populações na
Amazônia não seria pior do que mantê-las em poucas cidades? Por que o fato de
viver-se em grandes aglomerações aumenta as necessidades básicas? Vivendo de
formas mais dispersas não teríamos as mesmas necessidades básicas de moradia,
alimentação, vestuário, transporte, acesso ao conhecimento, ao lazer, etc? Por
outro lado, não parece pouco plausível que os seres humanos, em sua maioria,
venham preferir viver longe das grandes cidades? De fato existe
incompatibilidade entre a grande cidade e o desenvolvimento sustentável? Eis
uma ótima discussão que em ambiente escolar pode render muito em elevação do senso
crítico dos estudantes.
A
essas questões levantadas outras poderiam ser acrescentadas. Mas o que importa
é assinalar que a busca de soluções para a questão ambiental é ainda uma questão aberta, que já tem várias referências importantíssimas,
como é o caso da Agenda 21. Mas está longe de ser encerrada,
o que é fácil de ser compreendido quando tratamos da questão do
desenvolvimento sustentável, que longe de ser um aspecto técnico de nossas
vidas, busca solucionar aquilo que a humanidade, consciente ou inconscientemente
vem buscando desde sempre e ainda não encontrou.
Uma
segunda forma de relação que a escola pode travar com a Agenda 21 é tomá-la
também como um guia de ação e fazer dela um instrumento que oriente a gestão
ambiental da escola. Tínhamos dito, anteriormente que a Agenda 21 é um guia
para ação tanto em escala macro (planetária) como em escala micro (nosso
bairro, nossa escola). O documento traz a orientação de criar-se "Agendas
21" para cada localidade, para que o guia esteja em consonância com as
características regionais e os problemas de cada localidade. Assim, por
exemplo, o Ministério de Meio Ambiente tomou a iniciativa de lançar a discussão
para a produção de uma Agenda 21 brasileira (7). Ao mesmo tempo estados e
municípios devem estar mobilizados para chegar a suas Agendas. Com esse
espírito as escolas podem pensar na discussão e aplicação da Agenda 21 tendo em
conta a própria condição ambiental da escola, assim
como do território em que ela está inserida. Muitas iniciativas já existem, mas
nos parece essencial chamar atenção para o fato de que não há sentido em
discutir-se a questão ambiental enquanto tema interdisciplinar sem referir-se
ao próprio quadro ambiental da escola. Não dá para falar em sustentabilidade
e ao mesmo tempo a escola não ter formas sustentáveis de descartar seu lixo e
seus esgotos. É claro que quem deve solucionar questões como esta são as
autoridades, mas a comunidade escolar pode pressioná-las, e pode mesmo tomar
algumas iniciativas a partir da Agenda 21 local, ou mesmo a geral, porque esse
documento é também uma referência que pode e deve ser usado como instrumento de
pressão.
*
Jaime Tadeu Oliva é geógrafo e autor de livros didáticos de Geografia para
Ensino Médio. Trabalhou como consultor da COEA/MEC
nos Parâmetros em ação do tema transversal Meio ambiente
2
AGENDA 21, Edição da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, p.
349.
3
"O ensino é também fundamental para conferir consciência ambiental e
ética, valores e atitudes, técnicas e comportamentos em consonância com o
desenvolvimento sustentável e que favoreçam a participação pública efetiva nas
tomadas de decisão. Para ser eficaz, o ensino sobre meio ambiente e
desenvolvimento deve abordar a dinâmica do desenvolvimento do meio físico/biológico e do sócio-econômico e do desenvolvimento
humano (que pode incluir o espiritual), deve integrar-se em todas as
disciplinas e empregar métodos formais e informais e meios efetivos de
comunicação". (AGENDA 21, Edição da Secretaria do Meio Ambiente do Estado
de São Paulo, p. 350)
4
Trata-se da Lei sobre Política Nacional de Educação Ambiental n.º 9.795 de
27/04/1999. Essa lei assinala que a Educação Ambiental é um componente
essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente de forma
articulada em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter
formal e não formal. A presença no ensino formal da Educação Ambiental deverá
abranger os currículos das instituições de ensino públicas e privadas,
englobando: Educação Infantil; Ensino Fundamental; Ensino Médio; Educação
Superior; Educação Especial; Educação Profissional; Educação de Jovens e
Adultos. Todavia - e isso merece toda a atenção - ela não deve ser implantada
como disciplina específica no currículo de ensino e sim adotada numa
perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade.
Ou como fazem os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental, que
adota o tema do meio ambiente como tema transversal.
5
Inclusive essa série do programa Salto para o Futuro, cujo tema é a Agenda 21,
é um desses efeitos positivos.
6
Isso porque mesmo diminuindo o consumo desnecessário, será preciso aumentar o
consumo, de alimentos, por exemplo, de parcelas imensas, no mundo todo, que
estão em situação muito precária.
7
Já há uma publicação do Ministério do Meio Ambiente denominada Agenda 21
brasileira (Bases para discussão).
Bibliografia
AGENDA
21 (Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – Rio
de Janeiro, 3-14 de junho de 1992). São Paulo: Secretaria do Meio Ambiente do
Estado de São Paulo, 1997. 383 p.
AGENDA
21 Brasileira – Bases para discussão/por Washington
Novaes (Coord.) Otto Ribas e Pedro da Costa Novaes.
Brasília MMA/PNUD. 2000. 196 p.
FERRAZ
DE CAMPOS, José Gaspar. Agenda 21; da Rio/92 ao local de trabalho. São Paulo. Iglu
Editora. 1996. 108 p.