(contribuição
de Fernanda Pupo)
Você
tem uma nomenclatura muito linda, mas saiba que eu te amaria mesmo que você se
chamasse Ergastoplasma... Sabe que quando eu te vejo, minhas mitocôndrias entram
em fermentação, a meiose se acelera e meus gametas ficam todos assanhados? É
verdade porque você tem um fenótipo tão lindo que tenho uma tese de que o seu
código genético foi seqüenciado por um artista muito inspirado, em plena geração
espontânea.
Quando você surge, em movimentos amebóides, bela, túrgida e
charmosa, começo a sentir os efeitos de reações físico-químicas em meu
organismo. Seu tropismo em relação a mim afeta o córtex do meu sistema
sensorial! Ao tocar sua celulósica mão, nossos glicocálix se encontram. E se
seus olhos, perdidos, semelhantes a ocelos de planária, não se cansam de me
fixar, é porque minha antena está ligada em você. Sua cetácea presença mexe com
minhas enzimas, hormônios, meus neurotransmissores, até minha cadeia
respiratória já não funciona direito, nem mesmo para a coordenação meu trêmulo
tríceps. De m eu frontal escorre o que restou de secreção sudorípara. Seus
ferormônios realmente me tiram de homeostase. Seus cílios e pilos me causam
flagelos impensáveis. Palpitações sistólicas arrebentam meu pericárdio.
Ah,
querida, e quando quero repor as perdas metabólicas e te levo a uma confeitaria
para posicionar nossos níveis tróficos, a única gelatina que nos interessa é
aquela biomassa saborosa que chamamos de meio de cultura!
Mas apesar de
nossa relação harmônica em franca evolução, ultimamente você está num estado de
isolamento do que foi nossa protoplasmática simbiose. Sabe, se você continuar me
tratando com tanto acaso, vou me sentir menos que um inseto, um verme! Você dá
mais atenção às suas amigas, aquela tal de Drosóphila, à Taenia, a quem, por
sinal, nunca fui apresentado, do que a mim... E quem é esse tal de Rhesus, hein?
Ah meu Deus! Será que estou com complexo de Golgi? Devo estar entrando naquele
ciclo maldito - o ciclo de Krebs... e se esse processo seletivo continuar sou
capaz de cometer uma loucura, uma apoptose.
Por favor, não me trate assim de
forma virulenta, feito uma ameba ou um "Cavia porcellus porcellus", pois a estes
sei que você dedica apenas olhares científicos e sem paixão. Eu não sou uma
cobaia de laboratório. Eu não bacilo nem quando fico como um vibrião colérico.
Espero que você deduza que o meu sonho é passear abraçadinho contigo igual a um
carrapato, num lindo dia de sol, em Galápagos, dizendo para mim mesmo:
Cromossomos felizes!"