PROGRAMA DE FORMAÇÃO
CONTINUADA — TEIA DO SABER
DIRETORIA DE ENSINO – REGIÃO CENTRO
MÓDULOS I
E II
CURSO “METODOLOGIAS DE ENSINO DE DISCIPLINAS DA ÁREA DE CIÊNCIAS DA NATUREZA, MATEMÁTICA E SUAS TECNOLOGIAS DO ENSINO MÉDIO: FÍSICA, QUÍMICA E BIOLOGIA”
CRIATIVIDADE
http://www.ufrgs.br/faced/slomp/edu01136/piaget-criatividade.htm
Fonte: PIAGET, Jean.
Criatividade. In VASCONCELLOS, Mário Sérgio (org). Criatividade: Psicologia,
Educação e Conhecimento do Novo. São Paulo: Moderna, 2001. pág 11-20.
Existem dois problemas envolvidos em uma
discussão sobre a criatividade. O primeiro problema é o das origens ou causas
da criatividade. O segundo é o do mecanismo: como ele acontece? Qual o processo
de um ato criativo? Como alguém cria algo novo? Sem existir antes, como algo
novo pode surgir?
Gostaria primeiramente de dizer algumas
palavras sobre as origens ou causas da criatividade. Está muito claro que a sua
origem ainda é coberta de mistérios. De fato, alguns indivíduos são
visivelmente mais criativos do que outros, mas isso com certeza não é apenas
uma questão de genialidade. Na verdade, a origem da criatividade permanece
misteriosa, mesmo que esteja presente em todos nós.
Agora é moda entre alguns psicólogos,
quando eles se deparam com algo que é difícil de explicar, chama-lo de inato ou
hereditário, como se esta fosse uma explicação. Mas absolutamente não é uma
explicação, e desse modo só transferem o problema para o campo da biologia. E,
na biologia, estamos muito longe de ser capazes de explicar qualquer tipo de
atitude mental, que dirá a criatividade. Criatividade não é apenas uma questão
de precocidade em indivíduos que se tornaram muito criativos. Os indivíduos não
são sempre precoces. Mozart, é claro, é um dos melhores exemplos de uma alma
precoce e criativa. Mas muitos outros se tornaram criativos muito mais tarde em
suas vidas; foi bem mais tarde que tiveram as idéias mais originais.
O melhor exemplo disso é Kant. Por muitos
anos, ele não foi um kantiano. A maior parte de sua vida passou como um
discípulo de Wolf, e foi só nos seus últimos anos que sua própria originalidade
emergiu. Então, a princípio, a origem da criatividade para mim permanece um
mistério e não é explicável. Mas, como disse um momento atrás, todo indivíduo
que realiza um trabalho e tem idéias novas, mesmo que modestas, cria-as no
curso de seus esforços.
Algumas palavras mais sobre a origem da
criatividade. No percurso da minha vida, tenho criado uma ou duas idéias e
quando reflito sobre suas origens, penso que existem três condições. A primeira
é trabalhar sozinho, ignorar qualquer um e suspeitar de qualquer influência de
fora. Quando era estudante, tive um professor de física que dizia: "Sempre
que você começar a trabalhar em um novo problema, não leia e leve em conta o
que tem sido escrito sobre o assunto, fazendo as correções que julgar
necessárias". Temo ter levado o conselho muito a sério, isto é, devo ter
lido muito pouco. Mas para consolar-me, ou deixar de lado qualquer sentimento
de culpa que possa ter, gosto de pensar na fala de Freud: "A maior punição
que a divindade envia para alguém que escreve é ter de ler os trabalhos de
outros".
A segunda condição que acho necessária é
ler uma grande quantidade de coisas em outras áreas, e não apenas ler trabalhos
da própria área. Para um psicólogo, por exemplo, é importante ler biologia,
epistemologia, lógica, para que se possa promover uma visão interdisciplinar.
Não ler somente no seu próprio campo, mas ler muito nas áreas próximas e
relacionadas.
E um terceiro aspecto, e aí penso em meu
caso, é que sempre tive na cabeça um adversário, isto é, uma escola de
pensamentos cujas idéias algumas pessoas consideram erradas. Talvez cometa
injustiças e as deforme tornando-as adversárias, mas sempre tomo as idéias de
alguém como um contraste.
Meus principais contraditores são os
positivistas lógicos ou empiristas. Eles têm sido meus adversários por toda a
vida. Por exemplo, a atividade do sujeito, o sujeito do conhecimento, é
minimizada no positivismo lógico, embora do meu ponto de vista a atividade do
sujeito seja realmente o centro do desenvolvimento da inteligência.
A meu ver, conhecimento é uma estruturação
da realidade, e não simplesmente uma cópia. O desenvolvimento da inteligência
não é simples questão de associações empíricas, mas uma construção por parte do
sujeito. Então, como disse, em todo o meu trabalho o adversário tem sido o
empirismo e o positivismo lógico. Posso não ser importante para o meu
adversário, mas ele tem um papel importante para mim.
Agora gostaria de continuar com o segundo
aspecto que mencionei, que é o mecanismo da criatividade. Acho que o estudo da
psicologia da inteligência pode nos ensinar muito sobre esta questão. O desenvolvimento
da inteligência é uma criação contínua. Cada estágio do desenvolvimento produz
algo radicalmente novo, muito diferente do que existia antes. Desse modo, todo
o desenvolvimento é caracterizado pelo aparecimento de estruturas totalmente
novas.
(...)