Cresce interesse brasileiro por ciência
Fábio de Castro (11/1/2011)
http://www.agencia.fapesp.br/materia/13300/cresce-interesse-brasileiro-por-ciencia.htm
Agência
FAPESP – O interesse da população brasileira pela ciência aumentou
consideravelmente nos últimos quatro anos. A conclusão é da pesquisa “Percepção
Pública da Ciência e Tecnologia”, realizada no fim de 2010 com mais de 2 mil pessoas em todo o país e divulgada nesta segunda-feira
(10/1) pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).
Em pesquisa
anterior, realizada em 2006, o número de interessados ou muito interessados em
ciência era de 41% dos brasileiros. O percentual subiu, em 2010, para 65%.
De acordo
com o coordenador do estudo, Ildeu de Castro Moreira,
os resultados – que em breve serão publicados no site
do MCT – não apenas revelam um interesse crescente, mas apontam também que a
população brasileira tem uma percepção cada vez mais madura a respeito da ciência.
“Os
resultados mostram que a população brasileira confia no cientista, acredita que
a pesquisa é fundamental, apoia o aumento de recursos
para o setor e acha que a ciência traz benefícios para sua vida. Por outro
lado, as opiniões não são desprovidas de crítica: há uma consciência dos
perigos e limites éticos existentes. Concluímos que a população brasileira tem
uma percepção social bastante madura da ciência”, disse Moreira à Agência
FAPESP.
O estudo
envolveu 2016 pessoas, que responderam questionários semelhantes aos utilizados
na versão de 2006. As entrevistas foram estratificadas quanto a sexo, idade,
escolaridade, renda e região de moradia. A margem de erro, segundo Moreira, é de
2%.
“Esse
tipo de estudo é importante porque nos traz informações sobre a visão e as
atitudes do brasileiro em relação ao assunto. Ele identifica também carências e
lacunas. Esses dados podem nos fornecer subsídios para políticas públicas”,
afirmou.
Antes da
pesquisa de 2006, apenas um estudo sobre percepção pública da ciência havia
sido realizado em âmbito nacional, em menor escala, em 1987, de acordo com
Moreira.
“Esperamos
que dentro de quatro anos tenhamos uma série histórica que nos permita fazer
comparações ao longo do tempo”, afirmou. Segundo ele, os resultados serão
publicados em livro pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE),
permitindo comparações com o estudo de 2006.
Em São
Paulo, os trabalhos de percepção pública da ciência tiveram início em 2003, em
uma pesquisa pioneira e internacional, conduzida pela FAPESP,
pela Rede Iberoamericana de Ciência e
Tecnologia (Ricyt), da Argentina e pela Organização
dos Estados Iberoamericanos (OEI). Os dados deram
base para um capítulo contido nos Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação
em São Paulo – 2004, publicado pela FAPESP.
Meio ambiente em alta
Os
resultados mostraram que, para o público brasileiro, a ciência é mais interessante
que temas populares como esportes. Do total dos entrevistados, 65% se dizem
interessados e muito interessados em ciência e 62% em esportes.
O meio
ambiente é o tema mais “popular”, com 83% de interessados e
muito interessados. Em 2006, o percentual era de 58%. Em seguida,
aparece medicina e saúde, com 81%. Apenas 59% declararam-se interessados ou
muito interessados em arte e cultura. “O fato do tema do meio ambiente ter
ultrapassado medicina e saúde é um dos aspectos mais marcantes da pesquisa”,
disse Moreira.
Segundo
Moreira, no entanto, as respostas sobre o interesse pelos diversos temas
oferecem certa ambiguidade, já que as pessoas têm
concepções diferentes sobre o que é ciência, arte, ou cultura. Para superar
essa incerteza, seria preciso utilizar métodos qualitativos em um estudo com
grupos focais.
“Neste
tipo de enquete conseguimos fazer uma apreciação
geral e nacional. Se por um lado perdemos em profundidade, ganhamos em
generalidade – e como há várias questões, a incerteza em relação aos conceitos é
amenizada. Um aspecto importante foi que formulamos as questões dentro de padrões
internacionais e, com isso, poderemos no futuro fazer comparações com outros países”,
disse.
Os
assuntos preferidos entre os 65% interessados ou muito interessados em ciência
são ciências da saúde (30,3%), informática e computação (22,6%), agricultura (11,2%),
engenharias (8,4%), ciências biológicas (6%). Temas como matemática, física, química,
ciências da terra, ciências sociais e história ficam com percentuais entre 3% e
4%. Astronomia e espaço tem 1,6%.
Entre os
que declararam não se interessar por ciência e tecnologia, a maior parte, 36,7%,
alegou como razão para o desinteresse que “não entende” o assunto. Mais de 36%
alegam que visitam museus e não participam de eventos científicos porque eles não
existem em sua região.
“Grande
parte dos brasileiros declara não ter acesso a eventos e msueus.
De fato, a densidade de instituições científico-culturais é muito pequena,
especialmente no Norte, no Nordeste e no Centro-Oeste. Entretanto, a visitação e participação em eventos científicos aumentou
em relação a
Ciência nacional ainda é desconhecida
Embora
diversas respostas, segundo Moreira, tenham revelado uma visão madura do público
em relação à ciência, algumas delas chamam a atenção para o desconhecimento
sobre o tema.
Uma
parcela de quase 82% dos entrevistados não soube citar nenhuma instituição de
pesquisa científica no Brasil. Entre os demais, 23,5% citaram o Instituto Butantan e 12,1% citaram o Instituto Oswaldo Cruz. Mais de 87%
não souberam citar nenhum cientista brasileiro importante. Entre os demais, 40%
citaram Oswaldo Cruz e 29% citaram Carlos Chagas.
“Trata-se,
sem dúvida, de uma deficiência associada à precariedade da escola, tanto no
ensino básico como na universidade. Os livros não têm conteúdos sobre o que foi
feito na ciência nacional. A mídia em geral também não dá destaque a isso e é muito
mais pautada no exterior – com boas exceções”, disse Moreira.
Houve
avanços, no entanto, na apreciação dos brasileiros sobre a ciência nacional
desde 1987, quando mais da metade dos entrevistados a consideravam
atrasada em relação ao contexto mundial.
“A
apreciação que é feita hoje é bem realista e coloca a ciência nacional em um
patamar intermediário – onde de fato ela está. Hoje apenas 26% acham que temos
uma ciência atrasada”, disse. Quase 50% dos entrevistados consideram a ciência
brasileira em um patamar intermediário e 19,7% a julgam avançada.
Em relação
aos benefícios trazidos pela ciência, segundo Moreira, a população brasileira é
a mais otimista do mundo. “O otimismo é uma característica cultural do
brasileiro. Além disso, houve um avanço econômico e social importante no país
nos últimos anos e muita gente teve acesso à televisão,
celulares e internet – o que é associado com a
tecnologia”, disse.
Os médicos,
segundo a pesquisa, são as fontes de informação sobre ciência com mais
credibilidade para 27,6% dos entrevistados. Os jornalistas, para 19,9%. Os
religiosos para 13,6%. Os cientistas de institutos de pesquisa públicos para 12,3%.
Já os cientistas que trabalham para empresas são a fonte com mais credibilidade
para apenas 4,1%.
Outros resultados
Para mais
de 42% dos entrevistados, a ciência traz mais benefícios que malefícios. Para
quase 39%, traz apenas benefícios. Exatos 14% acreditam que a ciência traz
tanto benefícios como malefícios. Apenas 2,5% acreditam que os malefícios
predominam.
Os benefícios
da ciência mais citados pelos entrevistados foram aqueles trazidos para a saúde
e proteção contra doenças” (26,1%) e para melhorar a
qualidade de vida (19,1%). Os principais malefícios foram “trazer problemas
para o meio ambiente” (26,9%), “redução de emprego” (12,9%), “provocar o
surgimento de novas doenças” (12,6%) e “produzir alimentos menos saudáveis” (12,2%).
Para
metade dos brasileiros, o conhecimento dá aos cientistas poderes que os tornam
potencialmente perigosos. Para 56%, a maioria das pessoas é capaz de entender o
conhecimento científico se ele for bem explicado. Para 51%, a pesquisa científica
é essencial para o desenvolvimento da indústria.
As
descobertas científicas em si não são boas nem más – o que importa é a forma
como elas são usadas – na opinião de 57% dos entrevistados. Para 66%, as
autoridades devem obrigar legalmente os cientistas a seguirem padrões éticos.
Os
cientistas são “pessoas inteligentes que fazem coisas úteis à humanidade” para 38,5%
da população. São “pessoas comuns com treinamento especial para 12,5%. Para 11,1%,
são pessoas que trabalham muito sem querer ficar ricas.
Para 9,9% são “pessoas que se interessam por temas distantes da realidade dos
outros. Para 9,3%, são “pessoas que servem a interesses econômicos” e para 7,3%
são “pessoas excêntricas de fala complicada”.
As
necessidades tecnológicas definem os rumos da ciência para mais de 40% da
população. Para 16,8%, os rumos são ditados pela demanda do mercado econômico
e, para 9,1%, pelas grandes empresas multinacionais.
O
desenvolvimento da ciência brasileira não é maior porque os recursos são
insuficientes, na visão de 31% dos entrevistados. Para 16,3%, o problema são os
laboratórios mal equipados. Mais de 12% acham que o número de cientistas é pequeno.
Os
governos devem aumentar os recursos que destinam à pesquisa científica e tecnológica,
na opinião de 68% dos entrevistados. Para 72%, as empresas privadas brasileiras
deveriam investir mais na pesquisa. Na opinião de 30% da população, o
desenvolvimento científico e tecnológico levará a uma diminuição das
desigualdades sociais no país.
Para o público,
as áreas de maior importância para o desenvolvimento no país são os setores de
medicamentos (32,1%), agricultura (15%), mudanças climáticas (14,8%) e energia
solar (14%). Depois aparecem biocombustíveis (6%),
computadores e tecnologia da informação (4%), ciências sociais (3,6%),
biotecnologia (3,3%), exploração de recursos do mar (1,9%), nanotecnologia (1,3%)
e exploração espacial (1,3%).