INVASÕES BIOLÓGICAS
10/09/03 - Sílvia R. Ziller (*)
Brasil, país com nome de árvore.
Brasileiros, nós os predadores.
A extração predatória de madeira desde o princípio e sempre.
A cana e outras lavouras acabaram com 92% da Mata Atlântica.
O café ajudou e avançou sobre o cerrado, do qual só restam 5%.
Depois a braquiária, o gado, agora a soja, transgênica ou não, comendo a Amazônia pelas beiradas.
Festeja-se a safra recorde de grãos, enquanto se caçam gringos "biopiratas" de aranhas e sementes!
E esse governo tem uma ministra do meio ambiente que não merece.
Amansa Brasil!
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Palmas, 17 de Outubro de 2003 - Associação da União de Aldeias Krahôs vence concurso internacional por ter feito resgate da espécie pôhypey. A Associação União das Aldeias Krahôs (Kapéy) foi selecionada como um dos dez vencedores do prêmio Slow Food de Defesa da Biodiversidade, uma iniciativa do Movimento Internacional Slow Food, entidade sem fins lucrativos que reúne cerca de 65 mil sócios em 45 países do mundo inteiro. A premiação está prevista para ocorrer no próximo dia 9 de novembro em Nápoles, na Itália, e cada um dos dez concorrentes receberá um prêmio em dinheiro no valor de 3,5 mil euros. A entrega será feita ao presidente da Associação Kapéy, Getúlio Orlando Pinto Krahô, convidado da Slow Food para representar o projeto.
A indicação da associação Kapéy foi motivada pelo resgate feito pelos índios de uma variedade tradicional de milho, chamado pôhypey, que havia se perdido na década de 70, quando a agricultura tradicional foi substituída pela convencional nas aldeias indígenas. O resgate do passado perdido, imprescindível para assegurar o futuro das novas gerações dessa etnia, ocorreu em 1995 quando os Krahôs procuraram a Embrapa, em Brasília, para certificar a existência do milho em seus bancos de germoplasma.
Para surpresa dos indígenas, nas câmaras frias da empresa estavam os grãos das sementes do milho exótico que muito representava para as Krahôs. Essas sementes foram coletadas na década de 70, junto aos índios Xavantes, no Mato Grosso.
Cientes de que aquelas sementes poderiam ajudar a recuperar as tradições e diversificar as roças dos Krahôs, pesquisadores da Embrapa selecionaram uma amostra para ser distribuída e plantada por cada família das aldeias. O retorno provocou um grande impacto cultural na comunidade.
Antigos cantos e danças ligadas ao plantio e à colheita voltaram a ser realizados. O trabalho de recuperação da agricultura tradicional teve grande repercussão fora da aldeia, tanto que em 1998 recebeu o prêmio máximo do Programa de Gestão Pública e Cidadania da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no valor de R$ 10 mil.
Fome Zero
Pesquisadores da Embrapa acompanharam o processo de multiplicação das sementes nas principais aldeias Krahôs. Esse contato evoluiu para outras propostas como a utilização da conservação de recursos genéticos e segurança alimentar para inserir comunidades indígenas de todo País no programa Fome Zero. Boa parte dessas comunidades passa por grandes dificuldades e são dependentes do paternalismo de governos.
Pesquisadores da Embrapa acreditam que ações que visam a segurança alimentar, como a que está sendo desenvolvida junto aos Krahô, podem ter reflexos nos projetos estruturantes do programa Fome Zero. A idéia é que as comunidades indígenas selecionadas, que estão com deficiência nutricional, possam receber ferramentas e insumos para o seu trabalho, sementes para produção de alimentos e também materiais genéticos tradicionais, alguns deles perdidos, mas que tem um grande valor cultural para essas comunidades. A pesquisadora Terezinha Dias, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, considera que esse seria o grande diferencial do Fome Zero nas comunidades indígenas.
O primeiro contato da Slow Food com o projeto de resgate do milho pôhypey ocorreu por meio de material produzido por uma revista editada pela Embrapa. Em seguida, representantes da instituição participaram de uma reunião com o Ministério Especial de Segurança Alimentar, ocasião em que conheceram a metodologia utilizada para introdução desse material na área Krahô. No período de 8 a 12 de agosto deste ano, uma equipe da Slow Food, acompanhada de técnicos da Embrapa e da Funai, visitou a comunidade nas aldeias para avaliar o projeto, com vistas ao prêmio.
Ao escolher a iniciativa dos Krahôs para premiar o movimento, Slow Food justificou que o gesto de recuperar seu pôhypey é uma história exemplar pois, além de encontrar esse alimento tradicional, o grupo recuperou a prática de ritos relacionados ao plantio e a colheita do grão, parte original de seu estilo de vida e de sua identidade que também havia se perdido.
Além do resgate do milho foi feita a introdução nas aldeias Krahôs de espécies frutíferas. como o cajueiro-anão-precoce que irá enriquecer os quintais e fortalecer a alimentação daquele povo. "Essas sementes são muito importantes porque tem uma adaptação no local muito grande", ressalta Terezinha Dias. O inhame, o amendoim e a batata-doce também compõem a base alimentar dos Krahô.
Pesquisas
Outras pesquisas também se originaram a partir do resgate do milho. Há dois anos uma equipe de pesquisadores vem fazendo o levantamento e o estudo da biodiversidade das palmeiras existentes e seus respectivos usos pelos Krahôs. Já foram identificadas 18 espécies das quais 17 são utilizadas não só na alimentação como construção de casas, medicina natural e rituais. A idéia é um plano de manejo e conservação dessas palmeiras, um dos recursos nativos mais utilizados pelos índios.
O trabalho desenvolvido pela Embrapa na comunidade Krahô já é conhecido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que o citou por ocasião das comemorações dos 30 anos da Embrapa. Após a solenidade, ele foi abordado pelo presidente da Kapéy, Getúlio Krahô que falou da importância desse projeto para seu povo e pediu mais apoio para os órgãos envolvidos continuarem o trabalho de campo. Lula se mostrou interessado e até acenou com a possibilidade de visitar a aldeia para conhecer o projeto de perto.
Na ocasião, a quebra de protocolo feita por Getúlio Krahô despertou o interesse de outras entidades pelo projeto, como a Fundação Banco do Brasil que se mostrou disposta a financiar alguma atividade específica. Os Krahôs vivem na região de Itacajá, no nordeste tocantinense, ocupam uma reserva de 320 mil hectares, somam duas mil pessoas distribuídos em 16 aldeias.
kicker: Câmaras frias da Embrapa conservavam grãos de variedade já extinta
Nota:
(*) Sílvia Ziller, presidente do Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental, é Engenheira Florestal com mestrado e doutorado em conservação da natureza. Acredita que a conservação ambiental depende do uso adequado dos recursos naturais para garantir a permanência da vida na Terra. Tem experiência em pesquisa, análise e restauração ambiental na região sul e na Amazônia. Trabalhou no setor público, privado e hoje tem maior ação no terceiro setor. Tornou-se fellow da Ashoka Empreendedores Sociais no início de 2002 com a proposta de trabalho do Instituto.