Lista preliminar das espécies de borboletas na reserva particular de Patrimônio Natural
(RPPN) — Fundação Pró VerdeDr. André Victor Lucci Freitas
Museu de História Natural, Instituto de Biologia
Universidade Estadual de Campinas, CP 6109, CEP 13083970, Campinas, SP
Introdução
Com a crescente ameaça às últimas áreas naturais tropicais, a necessidade de identificação de bons grupos indicadores úteis no monitoramento ambiental tem sido cada vez mais urgente (Brown 1991, Brown & Freitas 2000a). Borboletas (Lepidoptera) figuram entre um dos melhores grupos indicadores, pois tem ciclo rápido, especificidade ecológica, e são fáceis de se ver e amostrar em qualquer época do ano (Brown 1991, Freitas et al 2003).
A mata atlântica é um dos sistemas mais ricos e diversos do mundo (Oliveira-Filho & Fontes 2000). Apesar da sua importância, mais de 90% da sua área original já foi destruída (Brown & Brown 1992, Coimbra-Filho & Câmara 1994, Dean 1995), e áreas extensas de vegetação primária existem apenas ao longo das cadeias montanhosas litorâneas do Rio de Janeiro à Santa Catarina.
O presente trabalho tem como objetivo o levantamento de borboletas de uma área extremamente bem preservada no litoral de São Paulo, discutindo seu uso para conservação e a importância da área para a manutenção da diversidade restante na mata atlântica.
Área de Estudo e Métodos
O trabalho está sendo desenvolvido na RPPN Pró Verde (23º 43' 09"S, 45º 43' 48"W), no Sertão do Bairro Barra do Una, São Sebastião, SP. A área possui 72,9 hectares paulistas, a maior parte coberta por mata ombrófila submontana (Ururahy et al. 1987).
O método de amostragem segue Brown & Freitas (2000a, b). As borboletas são observadas, registradas e identificadas visualmente, e eventualmente coletadas com puçás, ao longo de trilhas e riachos; armadilhas com isca de banana são posicionadas em locais iluminados na mata. Plantas hospedeiras são verificadas para larvas e ovos, os quais são criados até adultos sempre que possível. Especial atenção é dada aos recursos importantes, como flores, frutos fermentados, e poças de água na estrada, pois estes concentram muitas espécies de borboletas, facilitando o trabalho de registro e identificação das espécies.
Resultados e discussão
Até o momento, 69 espécies de borboletas foram registradas em 20 horas de trabalho de campo (Apêndice I). Apesar da lista ainda ser bastante preliminar, é notável a presença de espécies mais comuns na fauna do litoral fluminense (Pteronymia euritea, Eresia Eunice esora), e outras presentes apenas em locais muito especiais e bem preservados, talvez até ameaçadas no estado de São Paulo (Nymphalidae Hamadryas arinome, Eunica eurota, Eresia perna, Pseudoscada quadrifaciatta) (Brown & Freitas 2000b). De fato, pelo menos para uma espécie, Eunica eurota, a área estudada é a única colônia conhecida nos dias de hoje no Estado de São Paulo, o que, com base nos critérios atuais, já coloca esta espécie na lista ameaçada das espécies do Estado de São Paulo (já publicada em forma preliminar [São Paulo. SMA. 1998] e sendo re-estruturada por mim e pelo Prof. K. S. Brown Jr., do Museu de História Natural da Unicamp). Se este cenário já aparece com apenas 20 horas de trabalho de campo, é esperado que muitas outras espécies raras e ameaçadas estejam presentes na região, especialmente ao longo dos rios nas encostas de média altitude, como Moschoneura methymna (Pieridae), Agrias claudina e Prepona deiphile (Nymphalidae), todas prováveis de ocorrer na área, e incluídas na Lista Nacional das Espécies Ameaçadas de extinção (ver na consulta ampla na home-page [http://www.biodiversitas.org.br/f_ameaca/fauna.htm]).
Comparada com áreas mais degradadas ao sul (Baixada Santista, 550 spp) e outras bem preservadas ao leste (Picinguaba, 400 spp com muitas já presentes em São Sebastião), a lista de espécies da região do Sertão da Barra do Una poderia facilmente passar das 600 espécies, e ser um dos locais mais ricos do litoral do Estado de São Paulo. De fato, entre Barra do Una e São Sebastião, é notável a presença de espécies mais típicas da fauna encontrada mais ao norte, depois de Angra dos Reis, como Cissia terrestris, Eresia eunice, Pteronymia euritea, Scada karschina, Hamadryas arinome (Nymphalidae) e Esthemopsis inaria (Lycaenidae).
Por estes motivos, a região toda (de Barra do Una até Boiçucanga) foi definida área prioritária de preservação no estado de são Paulo.
Bibliografia
Brown Jr., K. S. 1991. Conservation of Neotropical environments: insects as indicators. In N. M. Collins & J. A. Thomas (Eds.). The conservation of insects and their habitats, pp. 349-404. Royal Entomological Society Symposium XV, Academic Press, London, England.
Brown Jr., K. S. & G. G. Brown. 1992. Habitat alteration and species loss in Brazilian forests. In T. C. Whitmore & J. Sayer (Eds.), Tropical deforestation and species extinction, pp. 119-142. Chapman & Hall, London, England.
Brown Jr., K. S. & A. V. L. Freitas. 2000a. Diversidade de Lepidoptera em Santa Teresa, Espírito Santo. Boletim do Museu de Biologia Mello Leitão, Nova Série, 11/12: 71–116.
Brown Jr., K. S. & A. V. L. Freitas. 2000b. Atlantic Forest butterflies: indicators for landscape conservation. Biotropica, 32 (4b): 934–956.
Coimbra-Filho, A. F. & I. G. Câmara. 1996. Os limites originais do bioma Mata Atlântica na Região Nordeste do Brasil. FBCN, Rio de Janeiro, viii + 86 pp.
Dean, W. B. With broadax and firebrand: The destruction of the Brazilian Atlantic Forest. Univ. California Press, Berkeley, xx + 482 pp.
Freitas, A. V. L., R. B. Francini and K. S. Brown Jr. 2003. Insetos como indicadores ambientais. In Manual Brasileiro em Biologia da Conservação (L. Cullen, R. Rudran and C. Valladares-Pádua eds.), in press. Washington, D.C.: Smithsonian Institution Press. No prelo.
Oliveira-Filho, A. T., and M. A. L. Fontes. 2000. Patterns of floristic differentiation among Atlantic Forests in south-eastern Brazil, and the influence of climate. Biotropica, 32 (4b): 793-810.
São Paulo. Secretaria do Meio Ambiente. 1998. Fauna ameaçada no estado de São Paulo. Documentos Ambientais - Série Probio/SP. 56pp.
Ururahy, J. C., J. E. R. Collares, M. M. Santos, & R. A. A. Barreto. 1987. 4. Vegetação. In Projeto RADAMBRASIL. Vol. 32. fls. sf 23-24 (Rio de Janeiro e Vitória). Edit. Ministério das Minas e Energia, Brasília, DF.
Apêndice I - Lista preliminar das espécies de borboletas na reserva particular de Patrimônio Natural (RPPN) — Fundação Pró Verde
Papilionidae
Parides anchises nephalion
Heraclides thoas
Protesilaus protesilaus
Protesilaus telesilaus
Heraclides hectorides
Pieridae
Appias drusilla
Archonias tereas
Phoebis philea
Phoebis argante
Phoebis trite
Aphrissa statira
Eurema albula
Eurema dina
Lycaenidae
Riodininae
Cremna alector
Eurybia hyacinthina
Theclinae
Calycopis sp
Lamprospilus orcidia
Nymphalidae
Danainae
Lycorea cleobaea
Danaus plexippus
Danaus gilippus
Ithomiinae
Melinaea ludovica
Mechanitis lysimnia
Mechanitis polymnia
Hypothyris ninonia
Ithomia lichyi
Pteronymia euritea
Pseudoscada erruca
P. quadrifaciatta
Brassolinae
Caligo brasiliensis
Opsiphanes invirae
Morphinae
Antirrhea achaea
Morpho achilles
Satyrinae
Hermeuptychia Hermes
Pareuptychia interjecta
Charaxinae
Memphis morvus
Biblidinae
Dynamine athemon
Eunica eurota
Hamadryas amphinome
Hamadryas arinome
Diaethria clymena
Limenitidinae
Adelpha delphicola
Adelpha isis
Adelpha plesaure
Adelpha cytherea
Nymphalinae
Eresia Eunice esora
Eresia perna
Eresia lansdorffi
Tegosa claudina
Anartia amathea
Anartia jatrophae
Heliconiinae
Dryas iulia
Heliconius ethilla
Heliconius erato
Heliconius numata
Heliconius sara
Hesperiidae
Pyrrhopyginae
Passova sp.
Pyrginae I
Urbanus doryssus
Urbanus teleus
Urbanus simplicius
Urbanus dorantes
Augiades epimethea
Salatis salatis
Pyrginae
Quadrus cerealis
Gorgythion plautia
Hesperiinae
Anthoptus epictetus
Thirynthia conflua
Cynea sp.
Vacerra caniola
Hesperiinae sp1